A primavera anuncia-se

27 Jan

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Janeiro chega ao fim! Estamos quase lá, no dia 31 deste mês que eu não gosto. Mas os dias já cresceram tanto! Um dia atrás do outro e um pouco mais de luz. Por entre o frio seco da manhã e tarde adentro, depois do nevoeiro que rapidamente se rende ao sol.

Embora as horas cortem, geladas, não há roupa que conforte, nem aquecimento elétrico ou a gás – talvez só uma boa lareira, mas isso eu não sei porque não tenho, mas dava tudo para ter – há sinais aqui e ali de vida a renascer.

É a primavera a anunciar-se antes do seu tempo de calendário – anuncia-se nos cheiros, na luz do sol que é diferente, no canto dos pássaros com notas de alegria e nos malmequeres do campo. Eu ainda não os vi! Mas disseram-me que o campo está coberto deles, surgiram de um dia para o outro, brancos e amarelos ao sol, bordando o prado verdejante que a falta de chuva não comprometeu ainda.

Antes de ontem era sexta-feira e eu não tinha visto os malmequeres. Ontem foi sábado e eu fui à procura deles, por perto. E então viu-os, uma amostra envergonhada de malmequeres brancos e amarelos. Muitos pequeninos entre a relva, ao sol. É a primavera que se anuncia, por aqui!

Hoje é domingo. O sol chegou de manhã cedo, depois partiu. Deixou um rasto de nuvens cinzentas escuras e vento no limoeiro. ♣

Bom dia, ano novo. Boa noite, ano novo

1 Jan

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Tão janeiro! Um frio diferente. Seco e profundo, fininho a roçar os ossos. Mal o senti no nariz quando pus a cabeça lá fora, para lá da janela, tive vontade de voltar a aconchegar-me no quentinho das mantinhas e da casa.

Na verdade dei por ele ainda ontem. Esse frio de inverno e de janeiro, que me faz ter vontade de hibernar – se eu pudesse, hibernava em janeiro! E só voltava com a primavera. Senti-o de manhã cedo, antecipar-se ao calendário. E depois piorar, quando o último dia do ano entardecia e eu entretinha-me a sonhar, sentada no banco de uma praça enquanto esperava G para o último chá de 2018.

Enrolada na mantinha, bebericando o vinho que sobrou de ontem – ergui a taça sem grande convicção, mera rotina, e depois cai de sono nas primeiras horas do novo ano –, embalo-me terça-feira-feriado o dia inteiro. Livros, filmes, expectativas e medos. É um longo e conhecido rosário.

Lá fora, o céu azul, magnificamente limpo, acaba de tornar-se negro. Bom dia, ano novo. Boa noite, ano novo. Daqui ainda não consigo ver as estrelas.♥♣

Por entre o nevoeiro, sonho com o rio

29 Dec

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Os dias são de nevoeiro a sul, quase sempre. Manhã cedo. Uma neblina densa, adormecida nas paredes das casas brancas e em cercas que perderam a cal. No horizonte, não há horizonte visível! Mas eu sei que há casas baixas para lá dos muros de nevoeiro. E montes. E um rio estreito.

Mas nessa hora que ainda nada vejo por causa da neblina, sonho com outro rio. Outras águas. Outra paisagem. Por entre o nevoeiro, sonho com um rio. Com um outro rio. Com o rio que vive comigo, com o rio que vive em mim. Um rio largo. Majestoso em cores de prata, onde agora me perco. ♥

Quase um mês depois.

23 Dec

Por uma razão ou outra, vou somando ‘páginas’ em branco. Num dia, não escrevo porque não fiz a foto para ilustrar o texto, não me sinto inspirada ou não tenho tempo (raios, que desculpa sem sentido!). No outro, convenço-me que tenho tanto frio que só me apetece ficar enroscada na mantinha, lã sobre os dedos das duas mãos que fogem do teclado.

E os dias correm. Fogem pelo outono adentro, diminuindo em luz lá fora. E agora já é inverno, acabado de chegar. E há sol, depois do nevoeiro. E é quase natal.

Um mês de ausência e tanta coisa mudou! Novas aprendizagens e encontros, passeios por aí, num namoro com a natureza que me faz bem e às vezes acalma – observar, observar, inspirar-expirar, deixar ir: sorrisos e lágrimas. Ouvir os pássaros que ficaram para além do verão, os galos nos montes, as vacas e as cabras que comem erva distraídas. E às vezes há um riacho que se entusiasma entre pedras e loureiros-rosa. E eu quase me entusiamo com ele, mergulhando no verde com o corpo todo, e a alma. Tanta coisa boa! E, no entanto, tanta estranheza! Tanto cansaço da viagem que não quis!

Felicidade é isso

16 Nov

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Felicidade é isso, qualquer coisa linda cá dentro. Que se ilumina. Bem no lugar dos afetos. Onde bomba mais forte o sangue que dá vida. É um momento mágico. Um respirar depurado e cristalino. Um lugar de conforto, que acontece. Uma lareira de outono com brasas quentinhas sempre inflamadas. A crepitar de alegria.

Felicidade é isso: um momento, umas horas, um dia inteiro desde o primeiro raio ao crepúsculo que se ilumina. Que nos ilumina. E nós iluminamo-nos. E nós somos capazes de qualquer coisa, à luz iluminada dessa força criadora.  Somos pássaro por momentos, por um dia inteiro do nascer ao pôr-do-sol. Somos harpa com vida própria, que não se cansa de tocar. Somos flauta. Somos poesia.

Quando a sinto chegar preparo um banquete para recebê-la. Somos velhas amigas. Ainda que passemos muito tempo sem nos encontrar. Ou sequer avistar. Mas existe entre nós um elo genuíno. Um laço que se encadeia e volta a encadear. Como se fosse a primeira vez. Como se fosse a milésima vez. Com uma enorme graça. E harmonia. Felicidade é isso. É não sei o quê bom, que nos apazigua e incendeia.♥

Por aí, do “Diário dos dias do fim”

7 Nov

 

Tenho andado por aí! A espairecer, sempre que a chuva me dá uma folga.  Absorvendo a paisagem que é absolutamente maravilhosa de qualquer ângulo. A qualquer hora. Sobretudo no outono, com campos verdejantes a perder de vista, salpicados de cores terra. De aqui, de onde estou agora, distingo umas pinceladas vermelhas e amarelas à sombra de um pinheiro. Não há vento, apenas uma aragem que cheira a limões. Abro a minha janela para absorvê-la, por inteiro! É quarta-feira e há sol.

Tenho andado por aí! Dia e noite, à volta dos meus prazeres. Com a lua chegam mais os livros, a malha (tem um efeito profundamente relaxante em mim. estou a fazer um casaco bem quentinho, pelos joelhos) enquanto ouço a informação na televisão, e novamente os livros. De dia escrevo, anoto ideias, preparo coisas, vou ao ginásio. Levanto-me cedo e sento-me ao computador a ler os jornais.

E entre umas coisas e outras, vou entretendo os dias com alegrias simples: no fim de semana plantei coentros e menta, as raízes enterraram-se na terra com uma determinação admirável!, agora só quero vê-los crescer. Antes tinha passeado com uma amiga minha, de infância, pelo campo. Regressámos a casa pela margem do rio no sentido descendente. Parámos para visitar uma pequena povoação. Havia sol também a essa hora que entrámos no monte pequenino e cheio de graça, de paredes brancas. E os pássaros e os galos cantavam. E os cães ladravam. E os perus juntavam-se à orquestra dos animais da quinta. Todos juntos recortando o silêncio do lugar, do lado da planície e dos cerros.  E a minha amiga e eu apanhávamos romãs quase silvestres, pequenas, vermelhas-rosadas por fora, com bagos suculentos da cor do sangue por dentro. ♥

30 de outubro, do “Diário dos dias do fim”

30 Oct

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Mais um dia e entramos em novembro. A chuva voltou ontem à noite. Ouvia-a pouco depois de me deitar. Caía determinada, abrindo riachos entre a calçada. Alagando o limoeiro. E afogando a salsa no canteiro por baixo da minha janela, no quarto onde não dormia.

Durante o dia tinha havido frio, muito frio, com uma nuvem cinzenta a pairar sobre a vila. Os montes brincavam às escondidas, ao ritmo das nuvens. Era o único alento. Tapa. Destapa. Adivinha o que vem a seguir. Deixei-me ir no jogo, o único que me entretém os dias quando a alma pesa, se afunda, e eu ainda tenho vontade de manter-me à tona numa distração bonita.

Agora, ora chove ora faz sol. Está frio, e ao sol aquece. É outono. E eu que tanto o quis, sinto-me asfixiar neste cenário bucólico, tão longe dos meus afetos. Tão longe dos dias felizes.

Há dias em que faço de conta. Que me integro. Que me adapto. Que sou capaz. Que não estou confusa. Que não tenho inveja (boa) das notícias boas que me chegam de longe. Que não tenho inveja das aventuras que outros ousam. Há outros, em que estou farta de fazer de conta. Não quero fazer de conta. Deixem-me dizer que dói muito.

Acordei com a chuva. Agora há sol. Uma inconstância estirada na manhã que se alonga pela tarde.  Em bicos de pés, bate-me no vidro da janela com diamantes em bruto e raios de luz.  E eu perto dela, dessa janela, confirmo este sentir inquieto que se revolta. Que se queixa. Que se lamenta descendo aos infernos da vitimização. São dias tão pesados! Horas tão duras. De um silêncio sem fim! Mas desse que não traz paz! Mas quem sabe?, talvez amanhã eu possa desenhar palavras com flores e corações! ♥

Relaxar

26 Oct

2018-10-26 17.50.35Não vejo a hora da hora do aconchego! Fim de tarde, lusco-fusco. Um livro para ler, um copo de vinho (tinto, Bio, produto local) para bebericar. A entrar no fim de semana – e na noite – devagar. Docemente. Engano o desejo de outra coisa. Enquanto chove lá fora, enquanto para de chover lá fora. E a humidade se agarra às paredes brancas. Com barras às vezes amarelas, outras azuis.♠

Acreditar, do diário “Dos dias do fim”

24 Oct

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Nos últimos dias, os dias revezam-se: Um cinzento e às vezes com chuva; outro luminoso, o sol a baloiçar num céu azul magnífico. Logo no dia seguinte. Ontem aconteceu um dos primeiros, e eu atravessei a vila velha de tantas subidas, a pé, lá para os lados do castelo, logo depois do nevoeiro ter-se recolhido. Ficaram nuvens negras a pairar sobre a fortaleza, àquela hora atravessada de gentes de muitas línguas.

Hoje, celebro um dos segundos com toda a sua glória. A lembrar os dias de primavera. Ainda guiada pela neblina, de manhã saí para a rua de casaquinho que acabei por pôr e tirar à medida da temperatura das ruas que fui cruzando. Apesar de já não ter febre, a gripe persiste numa tosse profunda que se intensifica à noite – como toda a tosse que se preza! –  impedindo-me de maiores horas noturnas de leitura. Há três anos que não tinha uma gripe assim! E, de repente…

Às vezes, é como se o desânimo quisesse instalar-se dentro de mim por uma qualquer porta ou debilidade física, já que de olhos abertos nunca o deixo permanecer na minha vida mais do que um dia. Nesse, é certo, mergulho bem fundo no inferno das minhas ‘desgraças’, permitindo esta fraqueza de sentir-me malfadada. Choro e grito o silêncio dos deuses. Exorcizo as minhas fragilidades.

Mas tenho um velho contrato comigo: não me deixar abater. Recomeçar a esperança sempre. Acreditar. É fácil? É muito difícil! E tenho tantos mecanismos para chegar lá! Aprendo a respirar para me acalmar.  Acalmo-me respirando. E olhando em volta.  Nestas paisagens magnificas campestres, perto de mim e mais além. Umas vezes mergulhadas de luz, outras de chuva ou nevoeiro, acariciadas pelo vento. Fiz o mesmo na cidade.

Hoje vou acalmar-me com a lua cheia, no primeiro dia de lua plena. Quando formos só nós duas na madrugada, e ela subir ao meu telhado para uma cavaqueira amena. E, então, será paz e tranquilidade em mim. Uma sensação sublime, que nem mesmo o sol me consegue dar!♥

Canecas de chá e páginas de livros

21 Oct

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O cuco partiu mesmo com a última andorinha! Mas contínuo a ouvir o canto dos pássaros, por perto. Cantam com tanta alegria que parece estarmos em agosto ou setembro. Cantam nos momentos de sol, uma magnífica bola amarela de luz morna e doce! Pareceu-me ouvi-los nos momentos de chuva copiosa, que criava poças nos ladrilhos do quintal.

Ouvi-os da minha janela, primeiro. Depois escutei-os. Cantavam. Foi assim ao longo dos dois dias. Enquanto eu tecia o fim de semana a ler páginas de livros e jornais. E a bebericar chá de gengibre.

Agora, tenho sol para a despedida do dia, deste domingo calmo. Que maravilha! E a janela aberta até ao primeiro sopro fresco da noite, que logo chega. Agora, o limoeiro diz-me que os pássaros já foram dormir. É o início de uma nova semana, a caminho de Novembro. ♥